quarta-feira, dezembro 29, 2004

Pergunta pertinente

«Os pobres são um pequeno número [...]; os ricos, por seu lado, são pouco numerosos. Entre estas duas extremidades de sociedades democráticas, acha-se uma multidão inumerável de homens quase idênticos que, sem serem precisamente ricos ou pobres, possuem bens suficientes para desejar a ordem, mas não os têm em demasia para suscitar a inveja.

[...]

Nas sociedades democráticas, a maioria dos cidadãos não vê claramente o que poderia ganhar com uma revolução, e sente em cada instante, e de mil maneiras, o que poderia perder com ela.»

in "Da democracia na América", Alexis de Toqueville


É isto que vos assusta? É isto que vos tolhe as mentes, que vos mantém silenciosos, cegos e surdos? É isto que faz com que o sofá pareça tão atraente? É esta a razão de tanto conformismo?

Prometeu

domingo, dezembro 26, 2004

Por fim, a morte de Deus

Desde sempre o ser humano tem necessitado de uma presença superior a quem possa apelar, desde sempre se tem recorrido à fé e àquilo que está "mais além" para conseguir viver.
Porém, já antes do século passado se assistia a um fenómeno que antes nunca tivera lugar: os humanos estavam a tentar matar Deus na sociedade ocidental e, com ele, todos os tipos de teologia ou mitologia. Esta morte foi estabelecida tanto no campo da Filosofia (Nietzsche, Existencialismo, etc.), da Política (Marx) e da Ciência (Darwin, Astronomia, Freud, Paleontologia, etc.). A reacção (da sociedade ocidental) pode ser dividida na sua generalidade em três tipos diferentes: o fundamentalismo religioso (principalmente cristão, mas também islâmico, por exemplo, em resposta às facções mais "ocidentalizadas"), o recurso à pura Ciência e uma posição de compromisso que tenta conciliar ambas as posições.
Não pretendo, pelo menos por ora, fazer uma exposição das falhas da teoria creacionista e do "criacionismo científico". Vou apenas demonstrar como a vida ou a morte de Deus não nos devem interessar, ou seja, como o ser humano se pode (finalmente, mas já com atraso) libertar da necessidade de saber se existe ou não Deus, um deus, deuses ou qualquer outro tipo de entidades superiores. Saber se Deus (e com Deus quero dizer uma qualquer entidade, não apenas o deus cristão) existe ou não é, penso eu, fundamentalmente impossível. Tal não interessa. Interessa apenas o facto de que Deus não interessa.
Em primeiro lugar há que atentar à expressão "entidades superiores". Tanto quanto sabemos, somos os seres mais sapientes que existem (ou pelo menos com a potencialidade de o sermos), então, porque é que temos a necessidade de nos rebaixarmos? O mesmo se passa com a forma de governo: porque é que o humano parece sentir a necessidade de alguém pretensamente superior para o controlar, para o dirigir? Necessitamos assim tanto de nos sentirmos reduzidos, diminuídos e incapacitados? Bem, por um facto muito simples: a falta de responsabilidade. O ser humano, ou pelo menos a maior parte dos elementos desta espécie, prefere acima de quase tudo não ter que ser responsabilizado pelo que faz, já que a responsabilidade traz consigo os resultados e as consequências das acções tomadas e das escolhas feitas. Então, a primeira razão pela qual se sente que se precisa de um deus é a incapacidade de sermos responsáveis (incapacidade essa que é ilusória, claro). Então, quando temos que fazer alguma coisa é porque Deus manda, ou porque tem que ser assim para podermos ir para o Céu. A ética fica completamente erradicada deste plano, resta apenas uma moral rígida que não dá espaço a qualquer reflexão pessoal.
Uma outra ocasião em que vemos o sobrenatural a ser invocado é quando a explicação de algo nos escapa. Quando algo está para além da nossa compreensão, seja técnica ou intelectual, recorremos a uma entidade que fornece todas as respostas, que é causa e efeito de tudo, na qual tudo começa e na qual tudo termina. Assim, numa tentativa de proteger o nosso ego da clara falta de conhecimentos que temos sobre tantas coisas, utilizamos a mais simples e inteligível de todas as explicações. (O que, curiosamente, vai contra o espírito de rebaixamento que referi há pouco... aparentemente os insultos só podem ser auto-dirigidos, nunca objectivamente perceptíveis). As coisas que nos fazem confusão, que nos deprimem ou que nos deixam mais debilitados também se encaixam nesta categorização: a morte, o sofrimento e a guerra. Todas estas coisas são parte do desígnio (que, não esqueçamos, é insondável!!) de Deus. Todas as coisas são "culpa" dele também - isto apenas mostra como na prática destrinçar estes aspectos é difícil.
Por fim precisamos de Deus para dar um sentido, um objectivo às nossas vidas - qual é a religião que não apresenta uma solução post-mortem para os dilemas da vida? O ser humano, sentido-se oprimido pela inevitabilidade da morte, refugia-se na ideia da não-morte e da recompensa depois da morte. Só assim o humano, fraco, irresponsável e desorientado consegue caminhar as encruzilhadas da vida.
Então, qual é a solução? É simples - é tomarmos consciência da nossa identidade como pessoas, tomarmos consciência da necessidade imperiosa de construirmos para nós um sistema ético, é tomarmos consciência que as nossas limitações presentes serão as nossas possibilidades futuras não procurando dar explicações simplificadas, é construirmos para nós um projecto de vida que inclua este mundo e não um suposto outro.
Prometeu

segunda-feira, dezembro 13, 2004

Uma pequena correcção

Queria apelar, em memória desta recente semana dedicada a uma doença que mata cada vez mais pessoas em Portugal e no mundo, que as pessoas deixassem de cometer aqueles tão crassos erros de gramática simples que me fazem ficar tonto.
Assim, apelo à comunidade blogger e ao resto do país para parar de dizer e escrever "a sida". Dois comentários sobre isto - "sida" (como palavra) não existe, muito embora já venha contemplada em alguns dicionários (dos quais discordo abertamente e sem pudor), pelo que apenas existe a sigla S.I.D.A. Segundo comentário - S.I.D.A. não pode nunca na sua rica vidinha de palavra ser precedida pelo artigo "a". Porquê? Bem, pela razão mais velha de todas: S.I.D.A. é masculino. Ora pensem lá comigo, se não têm os cérebros muito cansados: Síndrome da Imuno-Deficiência Adquirida... Sendo que Síndrome é uma palavra masculina, logo dever-se-á dizer "o S.I.D.A."! Os franceses pelo menos acertam no género, ao dizerem "le"; como nós somos portugueses temos que fazer disparate e portanto contemplamos em dicionários uma palavra que não existe e ainda por cima trocamos-lhe o género. Francamente, coisas destas aprendem-se na primária!
Em anexo a isto, façam o favor de dizer "H.I.V."! Se temos uma sigla em português, para que carga de água estamos a usar a sigla inglesa?! V.I.H. - Vírus da Imuno-Deficiência Humana.

Já que estamos embalados nesta andança, não se diz "imprimido" mas sim "impresso" e quando queremos colocar algo no scanner (que, por acaso, se chama digitalizador) estaremos a digitalizar essa mesma coisa, não a "scaneá-la" ou outras barbaridades do género. E poderia ficar aqui até ao fim do mundo, claro... mas não!

Prometeu

terça-feira, dezembro 07, 2004

Matemática natalícia

Sendo que estamos a entrar nesta quadra, queria aproveitar para pôr a nu a estupidez que se encontra associada ao lindo sistema religioso ocidental que tem como denominação geral Cristianismo. É claro que eu já me deliciei a fazer isso mesmo em vários outros posts, mas por outras razões e considerando apenas o efeito geral. Agora vou ao particular, à base, para explicar umas coisinhas que a malta parece esquecer!

Consideremos a suposta razão do Natal... O nascimento de Jesus... Ora bem...
  1. O que raio é que os pastores faziam na rua com o gado no pino do inverno do Médio Oriente?
  2. Como raio é que um recém-nascido sobrevivia numa manjedoura nas dicas cujas condições?
  3. Ele morreu entre Março/Abril de 33 E.C (A.D.), com a vetusta idade de 33 anos e meio... Fazendo umas contas de matemática muito simples, quando é que ele nasceu?
  4. Não será muita coincidência que essa altura coincida com o solstício de inverno, especialmente se tivermos em conta que o Cristianismo sempre foi uma religião de agregação?

Então? Vontade de ir comemorar ainda? Bom, se eu começasse a falar do Natal como um fenómeno de puro comércio e de criação de necessidades que não existem, ficavam ainda pior! Ou então se víssemos a hipocrisia da boa-vontade... Mas deixo isso para vocês, leitores!

Prometeu

É Natal? Para quem?

Estamos em Dezembro, como já devem ter reparado. Por todo o lado se ouvem músicas de Natal, se vêem iluminações pelas ruas. As casas estão enfeitadas, surgem Pais Natais nos centros comerciais, as pessoas correm buscando prendas, algo que agrade (ou talvez não...) às pessoas de quem gostam (ou que lhes interessam...).
Eu gosto do Natal. Gosto mesmo, embora desde há alguns anos, por motivos pessoais, ele já não me diga tanto. Mas mesmo assim gosto, gosto muito. Gosto das músicas de Natal (tanto que sou capaz de as cantar em pleno Verão), gosto dos enfeites que tudo alindam. E, sobretudo, gosto do espírito de Natal, da solidariedade, deste ambiente que, embora tão consumista, continua a falar de amor, de compreensão, de entreajuda, de justiça.
Ou pelo menos eu achava que sim...
Hoje fui fazer um trabalho de EMIP (Epistemologia e Metodologia de Investigação em Psicologia – o pesadelo dos alunos do primeiro ano do meu curso!). Observação naturalista, na Baixa. Mais precisamente, na rua Augusta e na praça D. Pedro IV (vulgo Rossio), a pedintes.
No ar, havia música de Natal.
Em estruturas diversas, luzes, muitas luzes prontas a iluminar a noite.
Nas mãos das pessoas, sacos de prendas.
Nas suas mentes... não sei, a Psicologia não é bruxaria. Só posso falar do que vi, do que me chocou.
Observámos três pedintes, uma criança e duas senhoras idosas. Senhoras que possivelmente trabalharam toda a vida, foram mães, avós, e agora para (sobre)viver têm que pedir esmola.
À criança, até davam esmola, ou pelo menos passavam e sorriam, faziam uma festa ao cão que estava ao seu lado.
Às idosas...
Não estou a julgar ninguém, também eu passo muitas vezes por pedintes a quem não dou nada. Mas aquelas senhoras emocionaram-me, mexeram comigo, sobretudo uma que escondia a cara numa das mãos, talvez com vergonha daquilo que estava a fazer, que tinha de fazer, afinal, enquanto estendia outra, à espera que uma moeda caísse... E eram tão poucas, as moedas que caíam...
Conseguem imaginar isto? Conseguem ver isto na vossa mente? Sobretudo se lhe adicionarem uma banda sonora de Natal, como o “Feliz Natividade” ou o “We wish you a Merry Christmas”? Conseguem? E essa imagem não vos toca, não vos choca? As pessoas a passarem apressadas, afastando-se, desviando o olhar, ou então fixando-o como se vissem algo anti-natural, como se fosse errado o que a senhora estava a fazer, pedir esmola talvez para sobreviver?...
Tal como disse, também já muitas vezes passei por pedintes sem lhes dar esmola. Não sei porque é que hoje isto me afectou tanto. Talvez por estar de outro lado, não como transeunte mas sim como observadora, talvez por ver a vergonha, a humilhação, o desespero na cara daquelas mulheres. Talvez por ter ouvido as suas vozes trémulas a desejarem toda a felicidade do mundo a quem lhes dava uma moeda, mesmo que pequena. Talvez porque à sua volta tudo falava de alegria, de felicidade, de uma época em que, mais do que em qualquer outra altura do ano, se apela à solidariedade.
É Natal?
Para quem?

segunda-feira, dezembro 06, 2004

Um exagero?

Têm-nos criticado, como é natural que façam. Mas têm-no feito com base num pormenor que acho extremamente interessante e que merece toda a minha atenção, por considerar que é um argumento que acaba por dar razão ao que vimos tratando por aqui. Estas críticas não podem ser encontradas neste blog porque, mau grado as cerca de 500 visitas, quase ninguém se dignou ainda a comentar. Ressalve-se, por exemplo, o caso de Rodrigo Ribeiro, que logo no início (aqui) falou em falta de acção e em falta de "condições" e "vontades". Porém, em resposta ao repto ("Rodrigo Ribeiro, aceitas o desafio?" - Nocturna), nada foi dito. Em abono da verdade, e olhando para a secção do número de colaboradores, exactamente o que é que ele pretende fazer? Estamos sempre abertos a opiniões, a ideias de funcionamento, a novos membros! Além disso, é necessário estabelecer ideias que guiem a acção. Nos Neo-Illuminati, não se trata de agir segundo um certo quadro ideológico, trata-se de estabelecer um novo quadro ideológico para depois poder agir!

Fomos também acusados de estarmos a exagerar nas nossas pretensões, de sermos "pretensiosos"... Que posso dizer? Que melhor demonstração de conformismo querem vocês? Só porque alguém se propõe realmente a mudar alguma coisa, já somos "pretensiosos"?! Se todos pensassem assim, então simplesmente não existiriam avanços intelectuais fora os que fossem do ramo da pura ciência. E como já reiterámos, o positivismo científico do Iluminismo do século XVIII está ultrapassado e só pode ser negado por nós, tendo em conta todas as coisas que já aconteceram no panorama científico desde então.

Assim, à laia de conclusão, por favor, se têm comentários, façam-nos. Se têm ideias inovadoras e se identificam com a desidentificação da sociedade, digam-nos! A mobilização está iniciada, mas não queremos estabelecer um monólogo! Comentem, discutam, debatam!

Prometeu