É Natal? Para quem?
Estamos em Dezembro, como já devem ter reparado. Por todo o lado se ouvem músicas de Natal, se vêem iluminações pelas ruas. As casas estão enfeitadas, surgem Pais Natais nos centros comerciais, as pessoas correm buscando prendas, algo que agrade (ou talvez não...) às pessoas de quem gostam (ou que lhes interessam...).
Eu gosto do Natal. Gosto mesmo, embora desde há alguns anos, por motivos pessoais, ele já não me diga tanto. Mas mesmo assim gosto, gosto muito. Gosto das músicas de Natal (tanto que sou capaz de as cantar em pleno Verão), gosto dos enfeites que tudo alindam. E, sobretudo, gosto do espírito de Natal, da solidariedade, deste ambiente que, embora tão consumista, continua a falar de amor, de compreensão, de entreajuda, de justiça.
Ou pelo menos eu achava que sim...
Hoje fui fazer um trabalho de EMIP (Epistemologia e Metodologia de Investigação em Psicologia – o pesadelo dos alunos do primeiro ano do meu curso!). Observação naturalista, na Baixa. Mais precisamente, na rua Augusta e na praça D. Pedro IV (vulgo Rossio), a pedintes.
No ar, havia música de Natal.
Em estruturas diversas, luzes, muitas luzes prontas a iluminar a noite.
Nas mãos das pessoas, sacos de prendas.
Nas suas mentes... não sei, a Psicologia não é bruxaria. Só posso falar do que vi, do que me chocou.
Observámos três pedintes, uma criança e duas senhoras idosas. Senhoras que possivelmente trabalharam toda a vida, foram mães, avós, e agora para (sobre)viver têm que pedir esmola.
À criança, até davam esmola, ou pelo menos passavam e sorriam, faziam uma festa ao cão que estava ao seu lado.
Às idosas...
Não estou a julgar ninguém, também eu passo muitas vezes por pedintes a quem não dou nada. Mas aquelas senhoras emocionaram-me, mexeram comigo, sobretudo uma que escondia a cara numa das mãos, talvez com vergonha daquilo que estava a fazer, que tinha de fazer, afinal, enquanto estendia outra, à espera que uma moeda caísse... E eram tão poucas, as moedas que caíam...
Conseguem imaginar isto? Conseguem ver isto na vossa mente? Sobretudo se lhe adicionarem uma banda sonora de Natal, como o “Feliz Natividade” ou o “We wish you a Merry Christmas”? Conseguem? E essa imagem não vos toca, não vos choca? As pessoas a passarem apressadas, afastando-se, desviando o olhar, ou então fixando-o como se vissem algo anti-natural, como se fosse errado o que a senhora estava a fazer, pedir esmola talvez para sobreviver?...
Tal como disse, também já muitas vezes passei por pedintes sem lhes dar esmola. Não sei porque é que hoje isto me afectou tanto. Talvez por estar de outro lado, não como transeunte mas sim como observadora, talvez por ver a vergonha, a humilhação, o desespero na cara daquelas mulheres. Talvez por ter ouvido as suas vozes trémulas a desejarem toda a felicidade do mundo a quem lhes dava uma moeda, mesmo que pequena. Talvez porque à sua volta tudo falava de alegria, de felicidade, de uma época em que, mais do que em qualquer outra altura do ano, se apela à solidariedade.
É Natal?
Para quem?
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